Biografia resgata preciosidade do músico
Milton Nascimento é um acontecimento. É um preciosíssimo patrimônio do Brasil. Cantor, compositor, artista por excelência. Nos últimos 2 anos se iniciou vários eventos com ares de despedida e notava-se sua aparência às vezes um pouco frágil. Ele sempre foi muito discreto quanto a sua vida pessoal e nunca deu detalhes se estava acontecendo alguma coisa com sua saúde. Mas era notável que os traços não tão agradáveis da idade avançada batiam a sua porta. Recentemente, por reportagem, declarou que sofria mal de Parkinson e anunciou sua despedia dos palcos. Somente dos palcos, porque a música é sua vida. Então em meados de 2022 fez pequena turnê internacional de despedida, finalizando seu “último” show em sua terra de coração, Minas Gerais, recebido em um imenso estádio de futebol lotado. A arte de Milton tem a cara de Minas e as raízes de um Brasil mais antigo que as próprias Minas, com o ar da ancestralidade de um Brasil do qual muito de nós nem fazemos ideia e nem é possível fazê-lo.
O documentário “Milton Bituca Nascimento” não se dá o trabalho de anunciar formalmente quem é Milton para, por exemplo, quem nasceu depois dos anos 2000 ou pós pandemia e que facilmente pode não o conhecer. Também não se dá ao trabalho de construir uma narrativa heroica de uma pessoa facilmente herói. É um registro dos bastidores dessa última turnê onde aqui e ali somos apresentados a pequenos detalhes de uma gigantesca história desse artista. Obviamente deve haver muitos outros relatos, mas o documentário vem mesmo como um convite para que nós busquemos mais informações sobre esse senhor visto do canto de seu quarto, conversando sobre detalhes tão interessante de sua vida.
Mesmo sabendo da grandeza desse artista, é impressionante ver o quanto Milton é respeitado fora do Brasil seja por artistas consideradas lendas vivas, seja sendo alvo de estudo de universidades estrangeiras. Todos querem um pedacinho dele, todos querem sua presença, todos tentam defini-lo, mas é bem difícil uma só pessoa conseguir porque tudo o que é dito sobre ele neste documentário faz parte desse conjunto do que é Milton Nascimento.
Nascido no Rio de Janeiro e criado em Minas Gerais, um detalhe pareceu bem pertinente de se falar. Pelo documentário mesmo que mencionado rapidamente, embora tenha tido uma educação simples, pode ser considerada uma educação com certo acesso a cultura que foge um pouco da realidade de grande parte da população brasileira. Esse acesso, mesmo que pequeno, provavelmente foi o responsável por colocar várias sementes dentro desse ser humano maravilhoso que as cultivou em um senso artístico único através da música e da poesia. Na realidade muitas das vezes a poesia de Milton se confunde com suas melodias não faladas que chegam a lugares muito profundos, em uma vida do interior de Minas com gosto de fogão de lenha e cheiro de estrada de terra, dando lições de vida sobre o amor e a amizade.
Milton é o criador da famosa “Amigo é coisa pra se guardar, do lado esquerdo do peito….”, e da:
“…há que se cuidar da vida
há que se cuidar do mundo
tomar conta da amizade
alegria e muito sonho
espalhados no caminho
verdes, plantas e sentimento
folhas, coração
juventude e fé.”
E o que é interessante é que sua voz dá outra dimensão a essas palavras. Quando escutamos, parece mais com um hino. Com sentimentos à flor da pele. Ele fala da vida do imigrante, dos que saem do seu lugar e nunca mais são os mesmos. Fala sobretudo aos jovens, com muita esperança e otimismo.
Milton nasceu artisticamente para nós dentro da clássica MPB, mas virou um gênero musical em si sem se afastar dela. Conseguiu acompanhar o tempo se atualizando com constantes parcerias musicais. Não se engane em achar que só existe o Clube da Esquina, o que em si já é uma super obra-prima, Milton está assentado em todos os tempos e é atemporal.
E ele ainda fala com amor até hoje de sua amiga Elis Regina que dizia que se Deus tem uma voz, é a voz de Milton. Acertadíssimo! Elis também criou universos paralelos quando cantava as músicas de Milton. Quando você escuta “Travessia” cantada por ele, já é única por tão profunda que é a interpretação apesar da harmonia leve. E quando você escuta a versão de Elis, que não tem o mínimo de pudor ou contenção e que simplesmente acaba contigo, você então percebe que ambas as interpretações se complementam ou se unem. E sabendo o quanto um amava o outro e declaradamente diziam ter loucura um pelo outro, ficamos infelizmente só com a imaginação em pensar como seria Elis cantando “Nos Bailes da Vida”, música de Milton encontrada anotada no caderninho de Elis, dias depois de sua morte e que infelizmente ela não pôde cantar. Por isso, temos que aproveitar cada minuto da presença desse artista maravilhoso. A vida é muito mais bela por ter conosco Milton Nascimento.
FICHA TÉCNICA:
MILTON BITUCA NASCIMENTO
2025 / DOCUMENTÁRIO
Diretor: FLAVIA MORAES
Roteiro: MARCÉLO FERLA E FLAVIA MORAES
Consultor Artístico: AUGUSTO NASCIMENTO
Direção de Fotografia: PEDRO ROCHA
Montagem: LAURA BRUM E FLAVIA MORAES
Direção Musical: VICTOR POZAS E RAFAEL LANGONI
Trilha Sonora Original: VICTOR POZAS E RAFAEL LANGONI
Música: MILTON NASCIMENTO
Produção Executiva: LIZ REIS, GABRIELA TOCCHIO, ANA SAITO, PABLO TORRECILLAS
Produzido por: AUGUSTO NASCIMENTO, RICARDO AIDAR, LARISSA PRADO, ANDRE NOVIS, CAIO GULLANE, FABIANO GULLANE
Produtores Associados: FLAVIA MORAES, VICTOR POZAS, RAFAEL LANGONI
Produção: CANAL AZUL, GULLANE, NASCIMENTO MÚSICA E CLARO Distribuição: GULLANE+
