Ruy Guerra se arrisca, exercitando sua paixão pela poesia cinematográfica
É possível que você não saiba, mas o diretor de “Aos Pedaços” é um importantíssimo cineasta brasileiro, responsável por um dos clássicos do movimento Cinema Novo, com seu filme “Os Fuzis” de 1963. Essa apresentação é unicamente para dar justiça ao papel desse cineasta lendário e para que você não passe tão despercebido por este filme aparentemente desconectado ou que não faz jus a sua obra.
“Aos Pedaços” carrega uma história simples de um homem que vive com duas mulheres ao mesmo tempo em casas separadas e que descobre que uma delas supostamente planeja matá-lo. A partir desse ponto, todo um emaranhado de informações e sentimentos constrói camadas e mais camadas de subjetividade que juntamente com uma forma mais prolongada de contar a história faz desse filme um estudo de identidade dos três personagens.
O homem e suas duas mulheres de nomes iguais, passam o filme todo tentando entender o que são e o que sentem e como estão conectadas na sociedade (embora esse seja o tema menos discutido).
Toda a longa experiência de Ruy Guerra não é tão visível nos poucos minutos de filme. Pois o elemento social do qual o cineasta é tão habilidoso não consegue impregnar na vida dessas três pessoas como já conseguiu em outros trabalhos. E se você não se identificar com aquelas vidas, é provável que os 90 minutos de filme lhe pareçam maiores.
Por outro lado, as imagens que nos são entregues são bonitas, em um preto e branco quase elegante e minimalista. Os cenários são reduzidos com pouca informação aos nossos olhos, a iluminação das cenas fica em um contraste entre o claro e escuro que fica até elegante ou que remete ao barroco. Mas dá para entender que esta simplificação é para que nossa atenção fique voltada para o que está sendo dito pelos personagens. Ou seja, a palavra é o protagonista desse filme. É quase como se estivesse lendo um livro com imagem e som. Inclusive a própria atuação dos atores foi um pouco prejudicada, mesmo nos momentos mais teatrais. Com exceção para alguns pouquíssimos momentos da Ana interpretada por Christiana Ubach onde a voz e gestos contidos ganham força, mas infelizmente são cortados pela teatralidade que Guerra usou talvez demais. O fato é que este filme pode causar decepções aos que esperem repetições ou pode causar alegria em quem não espera o obvio desse cineasta respeitado. Com alegria percebe-se que Guerra se arrisca, exercita sua paixão pela poesia em um filme simples em imagens, pobre em som e profundo nas palavras.
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Cotação por Ossos:
5,0

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FICHA TÉCNICA:
Diretor: Ruy Guerra
Produtora: Janaina Diniz Guerra
Produtores Associados: Mariza Figueiredo
Argumento e Roteiro: Ruy Guerra
Elenco: Emilio de Melo, Simone Spoladori, Chris Ubach, Juilo Adrião
Fotografia: Pablo Baião
Diretor de Arte: Cedric Aveline
Montador: Mair Tavares e Daniel Garcia
Mixagem: Damião Lopes
Som direto: Antonio Grosso
Edição de som: Bernardo Uzeda
Figurino: Rô Nascimento e Kika Lopes
Maquiagem: Mari Pin
Assistente de Direção: Dandara Guerra
Produtora Executiva: Adriana Konig
Desenho de Produção: Fernando Zagallo / Kiki Garcia
Uma produção da Kinossaurus Filmes
Ano de Produção: 2020
Duração: 93 min
Idioma: Português
Exibição: DCP
Patrocinadores: BRDE, FSA E ANCINE.
Apoio Cultural: CIA RIO, PÓLO AUDIOVISUAL ZONA DA MATA, ENERGISA, SECRETARIA DE CULTURA DE MARICÁ.
Esse filme está sendo realizado utilizando recursos do Fundo Setorial do Audiovisual / Ancine
PRINCIPAIS FESTIVAIS E PREMIAÇÕES: Festival Internacional de Cinema de Rotterdam 2020: Mostra Tiger Burns (dedicada a grandes mestres do cinema mundial) / Festival de Cinema de Gramado 2020: Melhor Direção, Melhor Fotografia, Melhor Desenho de Som
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Cartaz do filme gentilmente cedido por Pandora Filmes e Sinny Assessoria e Comunicação
