Crítica: Aos Pedaços

Ruy Guerra se arrisca, exercitando sua paixão pela poesia cinematográfica

Vítor Damasceno

É possível que você não saiba, mas o diretor de “Aos Pedaços” é um importantíssimo cineasta brasileiro, responsável por um dos clássicos do movimento Cinema Novo, com seu filme “Os Fuzis” de 1963. Essa apresentação é unicamente para dar justiça ao papel desse cineasta lendário e para que você não passe tão despercebido por este filme aparentemente desconectado ou que não faz jus a sua obra.

Aos Pedaços” carrega uma história simples de um homem que vive com duas mulheres ao mesmo tempo em casas separadas e que descobre que uma delas supostamente planeja matá-lo. A partir desse ponto, todo um emaranhado de informações e sentimentos constrói camadas e mais camadas de subjetividade que juntamente com uma forma mais prolongada de contar a história faz desse filme um estudo de identidade dos três personagens.

O homem e suas duas mulheres de nomes iguais, passam o filme todo tentando entender o que são e o que sentem e como estão conectadas na sociedade (embora esse seja o tema menos discutido).

Toda a longa experiência de Ruy Guerra não é tão visível nos poucos minutos de filme. Pois o elemento social do qual o cineasta é tão habilidoso não consegue impregnar na vida dessas três pessoas como já conseguiu em outros trabalhos. E se você não se identificar com aquelas vidas, é provável que os 90 minutos de filme lhe pareçam maiores.

Por outro lado, as imagens que nos são entregues são bonitas, em um preto e branco quase elegante e minimalista. Os cenários são reduzidos com pouca informação aos nossos olhos, a iluminação das cenas fica em um contraste entre o claro e escuro que fica até elegante ou que remete ao barroco. Mas dá para entender que esta simplificação é para que nossa atenção fique voltada para o que está sendo dito pelos personagens. Ou seja, a palavra é o protagonista desse filme. É quase como se estivesse lendo um livro com imagem e som. Inclusive a própria atuação dos atores foi um pouco prejudicada, mesmo nos momentos mais teatrais. Com exceção para alguns pouquíssimos momentos da Ana interpretada por Christiana Ubach onde a voz e gestos contidos ganham força, mas infelizmente são cortados pela teatralidade que Guerra usou talvez demais. O fato é que este filme pode causar decepções aos que esperem repetições ou pode causar alegria em quem não espera o obvio desse cineasta respeitado. Com alegria percebe-se que Guerra se arrisca, exercita sua paixão pela poesia em um filme simples em imagens, pobre em som e profundo nas palavras.

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Cotação por Ossos:

5,0

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FICHA TÉCNICA:

Diretor: Ruy Guerra

Produtora: Janaina Diniz Guerra

Produtores Associados: Mariza Figueiredo

Argumento e Roteiro: Ruy Guerra

Elenco: Emilio de Melo, Simone Spoladori, Chris Ubach, Juilo Adrião

Fotografia: Pablo Baião

Diretor de Arte: Cedric Aveline

Montador: Mair Tavares e Daniel Garcia

Mixagem: Damião Lopes

Som direto: Antonio Grosso

Edição de som: Bernardo Uzeda

Figurino: Rô Nascimento e Kika Lopes

Maquiagem: Mari Pin

Assistente de Direção: Dandara Guerra 

Produtora Executiva: Adriana Konig

Desenho de Produção: Fernando Zagallo / Kiki Garcia

Uma produção da Kinossaurus Filmes

Ano de Produção: 2020

Duração: 93 min

Idioma: Português

Exibição: DCP

Patrocinadores: BRDE, FSA E ANCINE.

Apoio Cultural: CIA RIO, PÓLO AUDIOVISUAL ZONA DA MATA, ENERGISA, SECRETARIA DE CULTURA DE MARICÁ.

Esse filme está sendo realizado utilizando recursos do Fundo Setorial do Audiovisual / Ancine

PRINCIPAIS FESTIVAIS E PREMIAÇÕES: Festival Internacional de Cinema de Rotterdam 2020: Mostra Tiger Burns (dedicada a grandes mestres do cinema mundial) / Festival de Cinema de Gramado 2020: Melhor Direção, Melhor Fotografia, Melhor Desenho de Som

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Cartaz do filme gentilmente cedido por Pandora Filmes e Sinny Assessoria e Comunicação

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