É um thriller bem sólido e dentro da sobriedade sisuda imposta por essa cultura de “filmes posudos” de hoje em dia
Eis que aceitei a missão (“última missão” do ano antes do Natal – para fazer uma brincadeira usando o nome do filme) de resenhar sobre este filme que chegou ao streaming na última semana de 2024.
“A Última Missão” (All the Devil’s Men) é um thriller bem sólido e dentro da sobriedade sisuda imposta por essa cultura de “filmes posudos” de hoje em dia, mas sem inspiração, composto por homens vestidos de preto correndo com armas e gritando jargões militares uns para os outros. Tudo é tediosamente cínico, tirando dos personagens e da trama qualquer suspense.
É muito curiosa a sensação de assistir a um filme em que direção e roteiro caminham por sentidos opostos, mesmo que estejam sendo. Matthew Hope… esse sujeito escreve e dirige o filme, mas parece ser duas pessoas diferentes que conduzem a narrativa. Por um lado, o texto de Hope aposta no puro espetáculo rápido e imediato, “o filme pelo filme”, típico do cinema de ação. Para contar a história do caçador de recompensas contratado pela CIA para matar McKnight (Elliot Cowan), um ex-agente que se juntou ao Estado Islâmico. Nessa jornada, Collins embarcará para Londres ao lado de seu time extremamente habilidoso, visando abater seu alvo em uma caçada brutal.
Como outros do gênero, mas da sua própria maneira, é um filme de espaços. Do céu ao inferno e como o inferno pode ser levado ao céu. De amizade, amor e o que há de melhor na vida, sendo contaminados pelo que há de pior no mundo. Do sagrado sendo profanado. Mas também um recorte de uma geração, como a do ex-fuzileiro naval, toda arregaçada, amaldiçoada, com destino traçado.
Não é um filme muito equivocado ou mesmo um mau exemplar. Afinal, não tem como errar muito com um Gibson como um assassino em decadência sendo perseguido por matadores internacionais. Um filme de suspense bem decente. Ao mesmo tempo, ele tenta lutar para se diferenciar de outros filmes do mesmo gênero, mas meio que morre na praia mesmo após nadar a rodo para tentar se salvar neste vasto mar de um gênero tão saturado no audiovisual. A direção até tenta, é tecnicamente bem eficaz: ilustra bem o próprio roteiro, com uma boa decupagem, tem estilo. “All the Devil’s men” funciona se você quer um pouco de ação e não precisa de nada muito fora do comum.
No fim das contas, Fichtner recebe seus cachês, Milo Gibson faz uma imitação razoável de seu pai Mel Gibson, e a iluminação consegue, de alguma forma, deixar Sylvia Hoeks com uma aparência “desbotada”.
As atuações até são competentes, mas ninguém se destaca de forma significativa. Isso, aliado a um enredo simplista que tenta se passar por mais complexo, torna todos os personagens superficiais e sem profundidade e num amontoado de clichês. Soa mais como um filme de politicagem. O que por si só não seria um problema, se o texto de Hope não fosse tão raso neste sentido.
Claro, clichê, por si só, não é nenhum pecado quando bem empregado, pois, do contrário, filmes seriam respeitados única e exclusivamente pela pura originalidade.
E sabemos que, na prática, isso não existe.
Não é bem assim.
E o diretor e roteirista (melhor como diretor do que na escrita de roteiros) Hope, por sua vez, consegue submeter todas essas convenções a um estilo bastante particular visualmente falando.
Mas se for para reproduzir de tudo que já se viu e não agregar a nada novo e interessante, dá a sensação ao espectador de ter gastado tempo com só mais um episódio de “mesmices”.
O que me remete, como exemplo, a uma obra de S. Craig Zahler, que também é um thriller que bebe das raízes do neonoir: “Justiça Brutal” (ou “Dragged Across Concrete”). O filme é protagonizado por dois detetives amorais (um deles é vivido por Mel Gibson), cansados, melancólicos, que frequentemente cruzam as fronteiras da legalidade. Em suma, anti-heróis. Policiais completamente ‘desgraçados’ na vida (no sentido correto e purista da palavra ‘desgraça’). Personagens, enfim, bastante de tipos bem corriqueiros nessa espécie de narrativa. Algo que meio que ecoa no que seu filho, Milo, tenta fazer aqui e se sai relativa e razoavelmente bem.
Ao fim e ao cabo, estamos diante do paradoxo de uma obra que é um thriller que critica a burocracia tecnocrata, mas que acaba se tornando burocrática e monótona.
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Foto de capa: Cartaz do filme “A Última Missão”/Divulgação: Adrenalina Pura e Sinny Comunicação
