Em novo filme, Daniel Ribeiro aborda o universo das relações pós-30
Sentimentos que se confundem. Medo de perder o controle. Ansiedade por saber se uma decisão tomada foi acertada ou não. Essas são apenas algumas das nuances presentes em 13 Sentimentos, novo longa-metragem de Daniel Ribeiro, que chegou convenientemente aos cinemas no dia 13 de junho, um dia após o Dia dos Namorados e bem na data em que se celebra Santo Antônio, o santo casamenteiro. Aliás, o filme brinca com essa ideia de relacionamentos duradouros x relacionamentos curtos e, claro, os descartáveis.

Para quem conheceu e se apaixonou por seus filmes anteriores, vai se identificar facilmente com a nova empreitada, mas não pense que Daniel repetirá a fórmula que o conduziu ao sucesso há uma década: 13 Sentimentos não trata de relações adolescentes, primeiro amor e descobertas inocentes. O elenco aqui é adulto, ciente do que quer – embora confuso, caso contrário não haveria graça – e capaz de tomar decisões bem complexas, regadas a muitas cenas sensuais e sexo. Muito sexo!
Histórico

Em 2007, Daniel Ribeiro lançou o curta Café com Leite, uma história familiar, que mostrava um personagem adulto, tendo que lidar com a criação do irmão mais novo após a morte dos pais. Entre cuidar do irmão e o namoro, o protagonista passa por crises e momentos em que o mundo parece querer desmoronar sobre ele.
Em 2010, Daniel iniciaria um dos seus projetos mais ambiciosos, que o levaria ao seu primeiro longa-metragem. Trata-se do curta Eu Não Quero Voltar Sozinho, protagonizado por Fábio Audi, Ghilherme Lobo e Tess Amorim. A História gira em torno de Léo (Lobo) e sua amizade sincera por Giovana (Tess). A adolescente quer algo além da amizade com Léo, mas seus planos mudam quando Gabriel (Audi) entra no colégio. Ela passa a se sentir dividida entre os dois, mas é Léo quem conquista o coração de Gabriel e, juntos, eles recebem o apoio de Giovana (claro, depois de algumas crises de ciúme).
O curta acabou dando origem ao longa Hoje eu Quero Voltar Sozinho (2014) com o mesmo elenco. O filme se tornou a primeira produção em longa-metragem de Daniel Ribeiro, sendo um sucesso de público e crítica. O mercado de mídia física também se favoreceu, lançando o filme em edições simples e de colecionar, que rapidamente se esgotaram nas lojas. Hoje eu Quero Voltar Sozinho ganhou as telas da TV aberta, sendo reprisado periodicamente na faixa Corujão da TV Globo e conquistou o streaming ficando por muito tempo nos catálogos da Netflix e da Globoplay.
No auge da pandemia de COVID-19, a Imovision, atendendo um apelo de fãs, e percebendo um nicho comercial em pessoas isoladas em suas casas, relançou o filme em DVD e Blu-Ray, com os mesmos bônus (que incluíam os curtas Eu Não Quero Voltar Sozinho e Café com Leite) da edição para colecionador lançada originalmente. O resultado foi um sucesso!
Enfim, entre a onda das aventuras de Leo, Gabriel e Giovana, que abordava essa relação adolescente e seu novo projeto, Daniel se aventurou pelo curta Love Snaps (2016), totalmente gravado por celulares e produziu o longa Música Para Morrer de Amor (2019).
Agora
13 Sentimentos conta a história de João (Artur Volpi), um cineasta prestes a ter seu primeiro projeto em longa-metragem rodado e que tenta superar o término de um relacionamento que durou 10 anos. Mas, assim como sua vida amorosa, a profissional também não vai nada bem, quando a produtora resolve adiar o filme por tempo indeterminado. João, que havia recusado alguns convites para editar filmes, vê-se obrigado a editar curtas e comerciais de TV para conseguir pagar o aluguel.
À medida em que tenta reescrever o roteiro de seu longa, esquecer seu amor de uma década e pagar as contas do mês, o homem passa a se relacionar por aplicativos de encontros com diversas pessoas, almejando encontrar sua possível alma gêmea. As tentações são muitas, os flertes são constantes, mas nada livra João de um vazio interior.
Em meio a essa jornada de autodescoberta, o cineasta conta com o apoio e a amizade de Alice (Julianna Gerais) e Chico (Marcos Oli). Ele também tem a cumplicidade da mãe. O pai e o irmão são apenas citados na história.
Num desses encontros virtuais, ele conhece Vitor (Michel Joelsas) e a atração é imediata. Quase simultaneamente, invadem a vida de João o casal Alexandre (Fabrício Pietro) e Rodrigo (Daniel Tavares) que, após um primeiro encontro confuso (sobretudo para a mente de João), dão ao jovem uma oportunidade de trabalho surpreendente.

A partir deste ponto, 13 Sentimentos se desdobra de uma maneira divertida e, claro, erótica: João percebe uma nova oportunidade de ganhar a vida com sua formação profissional, passa a entender melhor os seus sentimentos e se encaminha para sair daquela fossa emocional na qual estava mergulhado desde os créditos iniciais. Em suma, ele passa a reconhecer a vida como algo que lhe pertence e a qual ele precisa defender com unhas e dentes.
Isso, no entanto, não é motivo – ainda – para tranquilidade, já que as contas continuam chegando e os amores parecem não se concretizar. É nesse momento que a mãe surge, mais uma vez, como um porto seguro. A cena, quase silenciosa, é uma das mais belas do filme: as feições de João vão mudando lentamente, suas barreiras vão caindo, e ele desaba num choro para, então, ser consolado pela mãe.
É interessante perceber o amadurecimento, tanto da direção de Daniel Ribeiro (que já era mais que eficiente em seus trabalhos anteriores), como também de seus personagens. Como dito anteriormente, se em Hoje eu Quero Voltar Sozinho tínhamos adolescentes descobrindo o amor e a sexualidade, agora temos um homem de 32 anos, aprendendo a lidar com o amadurecimento, com a vida adulta, com os desafios da carreira. Só para entender e comparar: é como se estivéssemos vendo os personagens a partir da segunda metade da série estadunidense Friends: todos com mais de 30 anos, tentando levar a vida e percebendo que algumas coisas realmente precisam ficar no passado. Por outro lado, ainda há muito do “antes” na vida de João: seu relacionamento durou uma década, ou seja: quando começou, ele ainda era um jovem de 22 anos, talvez estivesse saindo da faculdade, iniciando sua vida adulta. É muita história para ser absorvida.

Ele ainda está apegado ao seu passado, que ele conhece como seguro, ou seja, ao João de 22, 25 anos… Aos amigos, que têm a sua idade e aos novos conhecidos, muitos acima dos 40 anos… é uma miscelânea de idades, comportamentos e características com as quais ele deve aprender a conviver.
O elenco está muito afiado e Daniel aproveita a deixa de ser um filme mais adulto para lançar mão dos corpos dos atores (e também atrizes): tem muito foco em torsos nus e seminus, bem como em bundas e pernas (numa das primeiras cenas, João aparece só de blusa e cueca, expondo suas longas e belas pernas).
Mas é o sorriso de Artur Volpi que cativa o espectador. Dono de um largo e sincero sorriso, que não é economizado em nenhum momento do filme, o protagonista encanta pelo seu carisma e simpatia. Impossível não se apaixonar ao assistir ao longa-metragem.

Também há, como não poderia deixar de ser, uma mensagem política de fundo, como a defesa da democracia, dos direitos humanos, etc. Aliás, as referências já começam pelo título e pelas cores que o compõem na arte dos créditos. Essencial, em tempos tão obscuros.
Por fim, há algumas surpresas para os fãs mais atentos, como uma participação especial de Fábio Audi (o Gabriel, de Hoje eu Quero Voltar Sozinho) e do próprio Daniel Ribeiro.
Um filme essencial, bem escrito, bem dirigido e que merece ser visto sem as amarras preconceituosas que, infelizmente, ainda insistem em assolar nossa cultura. Viva o nosso cinema!
***
Cotação por ossos:

10,0
***
Cartaz e fotos do filme gentilmente cedidas por Lacuna Filmes e Sinny Assessoria
